quarta-feira, 2 de junho de 2010
Coagulação
Segue a vida. Sem arrependimentos.
Passado de guerra e paz, no front, em segundos, à espreita da bandeira branca, de um descuido da estima, um vácuo da carência.
Nuvens negras, carregadas, sempre avançaram no meu sábado de praia.
No respiro, o descanso tem prazo.
Moto contínuo: a barraca fecha, a canga dobra, o matte seca, o polvilho apodrece.
Manhãs rosadas, tardes atribuladas, noites geladas, vinho, aquisições musicais, festa, gargalhadas e dança. Ah! A dança. Em par, entrelaçada, nuca perfumada, inaltece a alma.
Infortuito. Telefone maldito de cabo infinito e alcance imediato, toca impiedoso.
Batidas enervam, diástole sufocante.
Do outro lado, o estrago. A nesga de ferida aberta.
Enfrento num relance impensado. Memória feroz de um timbre que não esqueço.
Feliz da tecnologia ainda sem aroma.
Amenidades e farrapos. Histórias e estórias remetem ao esforço de outrora, ao desperdício.
Nostalgia e asco em uma única frase. Vícios, clichês, dejavus.
Passado de guerra e paz, no front, em segundos, à espreita da bandeira branca, de um descuido da estima, um vácuo da carência.
Explica, implica, suplica.
Nuvens negras, carregadas, sempre avançaram no meu sábado de praia.
No respiro, o descanso tem prazo.
Moto contínuo: a barraca fecha, a canga dobra, o matte seca, o polvilho apodrece.
No horizonte, um rasgo de céu azul, num tom especial.
Profundo. Maduro. Inigualável. De tão poderoso, colore qualquer dúvida, desloca a camada glacial.
Terral e força mental firmam a previsão. Volta o sol inclemente, que queima, entranha, enrijece.
A nuvem passou, a fresta apagou, a brecha fechou, a nesga sarou. Coagulou.
Um mergulho.
Segue a vida. Sem arrependimentos.
Ao menos pra mim.
terça-feira, 1 de junho de 2010
Where´s the ground?
Pegadas na pedra fria no quarto do 201. Agora, já calçada, a descer os degraus de madeira barulhenta sigo no paralelepípedo da garagem. Lá estão meus pés sobre embreagem, freio. Acelero. Caio no subsolo de borracha, cimento, viajo os andares do elevador. Tapete. Mármore de empresários. Lama do subúrbio. Poça da Gávea. Asfalto sobre o metrô. Ginástica no alto do prédio. Banho sobre o suporte.
O direito, o esquerdo, clamam por chão. O corpo clama por chão. Há tempos...
Mas onde? Cadê a primeira camada, de onde colho a pura energia do centro da Terra?
Há quanto tempo não pisamos no chão de verdade... Se é que já tivemos esta experiência...
Sigo pra praia, mas, nem a areia é incólume, com buracos, estoques subterrâneos.
Num mergulho solitário, afundo. Um toque rápido do dedão, insuficiente, sufocante.
Avisto um gramado no Aterro, sinônimo de assoreamento. Sobreposição que afastou o mar.
Ali, descalça, louca, me engano, me deleito. Me olhem sim, não importa...
Caminho na terra molhada, penso, sonho. Entranho a sola, sujo os dedos, a unha, o esmalte cintilante.
É tarde. Calço as meias, sintéticas, coreanas.
De volta ao solo duro, criado.
Malcriado.
segunda-feira, 31 de maio de 2010
NÉCTAR
Minha vida é como as asas de um beija-flor. Movimentos acelerados que enganam a vista. Bate sem ver, voa sem sentir.
Abri as pálpebras com força, ajustei o foco e, depois do turvarão, me debruço a entender o trajeto. Voo sem planilha. Reflexo tácito que desvia do inesperado. Tão rápido que não dá chance à surpresa.
Até aqui, em viagens sem rota incomum, senti o gosto doce da independência.
Sabor que agora amarga a língua.
Sou livre, sem gaiola, iluminado, ao mesmo tempo, tenho medo.
Mas, guardo o temor sob as penas metálicas, sob o couro, no âmago.
Do contrário, a revoada egoísta me levaria, zombaria, engoliria.
Sou pássaro maduro, herói da seleção natural.
Por que então questionar conquistas? Para que pedir, se posso fazer sozinho?
Escolhas, alimento, ninho... Tudo meu. Tudo eu.
Descubro que de nada adianta ter pólen em profusão. Só pra mim.
Beija -flor que não divide, não tem pouso.
Reflexões ainda em curso já trazem ventos mais frescos.
Sim, minhas asas seguem rápidas. O radar é que apurou. Traço alvos desafiadores, tenho meta. Risco vertical.
Flores rasteiras, rasas de raiz, inodoras, deixo para os pombos ciscarem.
Busco agora as Margaridas polpudas que florescem no alto da sacada. Da bancada. Subo sem pudor, me mostro, me arrisco. Passeio em seus canteiros, invado seu arranjo, sem convite.
Torço para que me prenda em seus galhos tortos e frondosos.
Me roube a solidão, sem que eu implore.
Requer presteza, paciência, até encontrar brecha.
Talvez em breve, ou nunca, me canse de espiar seu jardim que, mesmo sem espinhos, espeta impetuosamente. No interim, me divirto com Lírios, Copos de leite e Jasmins.
Logo o faro me trai.
Volto a sua janela. Pairo no ar. Fito a doçura escondida entre as pétalas. Respiro de longe seu perfume natural.
À espera do NÉCTAR.
Por ele, só por ele, reduzo o giro, aguardo.
Arremeto.
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