segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

A Alegria Pode Ser Simples

Não havia grãos desocupados.
A chuva caía sem dó. Sem intervalo para evaporar.
Penteados, tecidos caros, perfumes...
Desmanchavam na areia.
Diluíam na correnteza.
Como oferendas para Iemanjá.

Eram milhões.
Ensopados. Mas, de verdade.
Revelando no rosto, de maquiagem derretida,
a marca do tempo.
Que ia passar, mais uma vez, em breve.
Que tinha que mudar para melhor dali pra frente.

Se o minuto fosse efêmero para os pedidos,
A prece poliglota se apressava.
Um sussurro universal na praia famosa.
Em inglês, o americano rezava por saúde.
Em francês, o belga gritava por dinheiro.
E em bom português, o brasileiro evocava a paz ao som de atabaques.

Cada qual com seu Deus, seu Orixá, seu Messias.
Crenças ecoavam sem fronteiras.
Sem trauma, sem passado.
Em Copacabana, a fé é ecumênica.
Qualquer religião tem o mar como testemunha.

No altar improvisado do Candomblé, a vela apagou.
O isqueiro do judeu deu luz à chama a tempo do ritual.
A emoção da carola contida com o lenço do angolano.
A dança de umbanda sacudia os gringos.

Afeto livre, a céu aberto.
O jovem gay abraçou o namorado a meia noite.
A adolescente teve a primeira bitoca roubada.
O casal de idosos festejou mais um ano de amor com beijo comovente.
A criança chorou com o barulho dos fogos.
E críticos picharam a pirotecnia a cada explosão.

Mais chuva, pés enrugados, banheiros afastados, multidão, cerveja cara, sapatos perdidos.

E a felicidade ali. Escancarada.

A repórter passou o Reveillon trabalhando.
Viveu a virada observando.
Tentando entender o motivo do entusiasmo.
Molhada com a água que escorria do céu.

Meu ano chega com esperança.
Com descobertas. Com alma lavada.
Desapegada.

Sim.
A Alegria pode ser simples.