terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Cães e Escombros




Três construções ruíram no Centro.
Vigas não quebraram.
Não racharam.                                      
Se desmancharam em pó fino.
Em segundos.

Um amontoado estranho na esquina do Teatro Municipal.
Montanha de poeira incandescente em frente à Cinelândia.
Fumaça, ora negra, ora branca, ventava por fendas soterradas.
Cabos de energia em curto. Bujões de gás. Papéis chamuscados.
E o trabalho de uma vida inteira irreconhecível.
Nenhum sinal de sobreviventes .

Em meio à angústia das famílias,
ao olhar estarrecido dos vizinhos,
ao suor dos bombeiros,
à apuração dos repórteres mascarados,
Dois garimpeiros sem pá.

Chegaram de caminhão.
A priore, ficaram longe, amarrados,
Se distraindo com uma bolinha de borracha.
Era preciso aguardar o descanso das escavadeiras.

No intervalo, seguiram para o entulho.
Uma busca precisa. Silenciosa. Limpa.
Os dois percorrem a área rapidamente.
Obstáculos perigosos são vencidos aos pulos.
Com rabinho abanando. 

_Vai lá, Boris! Cadê? Cadê?_ instiga o treinador.

O trote pelo cenário da tragédia é interrompido de repente.
Boris pára e retorna ao trecho já checado pelo focinho.
Testa mais uma vez o mesmo ponto. E segue o passeio.

Segundos depois, arrasta a pata dianteira sobre outra laje.
Late e salta.

A brincadeira do labrador achara um homem.
Um morador de rua já sem vida.
Enterrado antes de morrer.

Enquanto as equipes retiravam terra para resgatar o corpo, parentes choravam e a imprensa se pasmava com o estado daquele pobre senhor.

O cão seguia latindo.
Talvez ansioso para seguir na brincadeira.

Boris encontrou outros três corpos naquela tarde.

No fim do dia, ganhou biscoito, pote com água fresca e afago da mãe de um dos jovens encontrados .

_Graças a esse cachorro, meu coração se acalmou. _ disse Dona Yaçanã.

O filho dela não estava vivo.

_Agora, ao menos, ele terá enterro digno. Era um bom homem. Não merecia terminar aqui.
Será meu último carinho de mãe._