terça-feira, 1 de novembro de 2011

O QUE SEI ATÉ AGORA

Sei de mim. Ah! Como sei.

Tenho medo de avião. De barata. De injeção na veia. De galinha.
Não sei trocar lâmpada. Dirijo bem, mas, não gosto de estacionar.
Faço um feijão gostoso.
Adoro amigos em casa.
Evito locais subterrâneos.
Sou louca por jasmim.
Aprecio um cangote perfumado. Sem exageros.
Um banho fervendo. Água de alfazema, camisola velha e travesseiro baixo.
Espuma do sabonete. Spray de chantily. Roupa de linho. Nó de lenço. Óculos escuros. Meia felpuda. Lareira. Blush rosado e rímel. Muito rímel.

Detesto o som incoveniente: Da moto barulhenta. Da mulher infeliz. De quem fala gritando.
Do vizinho vascaíno. Do alto- falante do ferro-velho que me acorda aos sábados.
Fujo dos grudentos. Dos carentes. Das cobranças.
Das maledicências.

Gosto de gente boa. Boa gente. Gente doida.
De excentricidades. De gratidão. De tiradas rápidas.
Do afago de estranhos. De bobagem.
De rir sem controle em horas impróprias.
Da memória seletiva. Que guarda o que é bom.
Em detalhes.

Vivo de saudade. Do que vivi. Do que ainda não vi.
E rio com histórias bem contadas.
Rio de mim. Sempre.
Celebro a descoberta de virtudes. O humor desmedido.
A amizade incondicional. Antiga ou nova.
O pêssego maduro. A cama bem feita. O nascer do sol.
O almoço com meu pai aos domingos.
A comida feita por minha mãe.
Uma taça de vinho tinto e Madeleine nos ouvidos.
Em casa. Sozinha.

Torço por todos. Por tudo. Pelo otimismo sem motivo.
Não peço nada a ninguém. Só às vezes.
Tenho mau humor de manhã. Fome à tarde.
Pés, irremediavelmente, gelados o dia todo.
Sinto remorso pela planta que esqueci de molhar.
Por ter abandonado, mais uma vez, a academia.
Por não ter abraçado minha avó no almoço.
Por não estar mais tempo com meus sobrinhos.
Por não ter dito para o cara o que sentia naquela noite.
E tenho inveja, claro. Todos temos.

Lido bem com críticas. Com os enganos da minha intuição. Com meus cabelos brancos, mas, detesto as olheiras.
Detesto, muitas vezes também, meu jeito inquieto. Minha correria.
A desatenção nata que esquece o celular na geladeira.

Sou de poucas coisas. Poucas marcas. Poucos sonhos.
Quero mais é boiar em Búzios. Mergulhar em Ipanema. Sambar na laje. Cantar no chuveiro.
Fazer boas coberturas jornalísticas.
E, quem sabe, ter filhos.

Estou em dúvida sobre o discurso que farei, daqui a pouco, no casamento da melhor amiga.
Não sei se um dia escreverei um livro, mas, devo plantar uma árvore esta semana.
Não sei se troco meu sofá.
Se vou ao show do Sting nas férias.
Muito menos se casarei com o aquele que deve ser o amor da minha vida.
Não sei dizer. Não sei de nada.

Só sei de mim.
Ah! Como sei...

Por hora, já é suficiente.