terça-feira, 11 de outubro de 2011

Incondicional

Joana, de onze anos veio de Roraima.
Francielle, de dezoito, do Amapá.
A família de Morgana era do Rio mesmo.
Mas veio toda.
Doze parentes.

Calçada da  Rua das Oficinas, Engenho de Dentro, ala Norte do Estádio João Havelange.
O endereço deles e de mais dezenas de pessoas durante cinco dias.
Um acampamento de obsessão.
O alvo de toda a energia despendida é um jovem, muito jovem, cantor em ascensão.

Você que lê este texto já sabe quem é.
Até meu pai conheceu, depois da passagem avassaladora de Bieber pelo Brasil.
E pelos jornais.

Sem banheiro, sem colchão, sem sombra.  Resistiram ali até a abertura dos portões.
E tinham forças para cantar quando apontava o microfone.
Correr quando passava um helicóptero.
Chorar quando chegava uma van.

Em três dias de cobertura, aprendi as músicas, decorei o nome do cão, descobri a comida preferida e até a cor predileta do cantor. Mais do que isso:

Vi do que é capaz um fenômeno das massas. 

Na minha adolescência, gostava do A-HA e, principalmente, do vocalista do grupo.
Tinha um pôster na porta do quarto. Os discos, como trofeus, na mesa de cabeceira.
As letras na ponta da língua. Só.
Não era como as meninas da porta do Engenhão. Não era mesmo.

Elas são mais. Querem mais. Sonham mais.
E têm o apoio dos pais.
Ou dos maridos.

Encontrei um senhor sentado na cadeirinha de praia no meio da fila. Exausto.
Na TV, ao vivo, me disse que guardava o lugar para a esposa.
Maria Vanúbia o convencera a ficar ao sol, ao relento, para ver o menino de perto. E ele foi.
Estava bêbado de Bieber.
Só com muita cachaça mesmo.

Morgana gastou as economias para levar as duas filhas.
Torrou os níqueis e as forças.
Na hora do show, dormiu encostada na viga do palco.
As filhas mal ouviram as músicas. Só gritaram.
E saíram felizes da catarse.

Eu mesma fui seguida, durante horas, por três meninas que cismaram com uma ideia maluca.
O trio acreditava que eu iria estar com o astro. Que fora ali para entrevistá-lo.

_ Se você entrar no Engenhão, não entrará sozinha. Nós vamos com você. Não tem jeito._ ameaçaram.

Desiludidas, acabaram tirando uma foto comigo mesmo.

Do alto de meu pragmatismo, invejo esse olhar incondicional pelo desconhecido.
Invejo a dedicação desaforada pelo inalcansável.
A loucura juvenil que dispara corações.

Essa força estranha só tenho mesmo é pela vida.
E, mesmo assim, por vezes, com certa preguiça.

_E Bieber? Cantou mesmo?_ perguntei na saída.

_ Não importa!_ disseram as fãs, em couro.

Entendi, meninas. Entendi.