"Encha uma bacia com água. Puxe-a pra perto e o líquido escorre pro outro extremo. Empurre a bacia pra longe e o líquido se aproxima de você."
O provérbio no pára-choque de um caminhão, circulava reluzente como neon na via expressa. Anotei a frase no caderninho enquanto seguia para uma reportagem na Baixada Fluminense num domingo de plantão.
A experiência sugerida parece fácil.
Faça em casa e conjecture.
Água, apesar de vital, é insípida, incolor e inodora.
Quer um desafio bem mais instigante? Ponha um homem na bacia.
Mas não vale um cara qualquer. Me refiro ao macho que ataca os sentidos. Olfato, paladar, visão.
Como afastar a bacia?
Avistei o tal caminhão do provérbio parado no posto de gasolina. Paramos estratégicamente para abastecer. Não resisti e me aproximei da carreta abarrotada de ovos. Para minha surpresa, o motorista era uma mulher. Abordei a estranha. Uma mineira de uns cinquenta anos, magra, sorriso largo, braços fortes, mãos calejadas, mas com unhas impecávelmente coloridas de vermelho. Ali mesmo, à beira do asfalto, a caminhoneira deu um banho de sabedoria. Uma entrevista informal sobre a vida que vale a pena ser reproduzida.
Aquela senhora com sotaque carregado aprendeu a combater as desiluções nas curvas acentuadas das rodovias.
_Fico apaixonada sem ser correspondida? Sumo nas estradas sem deixar rastro. Se ele sentiu algo por mim, que venha atrás das marcas do meu pneu._disse ela.
Entre um cafezinho e outro seguimos com a aula:
_Quando o moço é diversão. Balanço a bacia sem medo. Pra lá e pra cá. A correnteza fica mais forte quando me convém. Mas não passa de marola.
_A onda perfeita requer sofrimento. Desprezo. Quando menos se espera, ela surge para você surfar.
E olha que em Minas não tem praia... Mas tem bacia...
Pelo visto, muita bacia...
_ Tenho cinco filhos, cada um com um homem diferente. Faço o que eu quero da vida. Todos os meus maridos querem voltar pra mim. No ano que vem me aposento e aí vou me aquietar.. Mas não vou escolher nenhum deles. Quero um cabra novo para mandar em mim.
A motorista ensina que para agir assim, é preciso conhecer os meandros da estrada. Ter quilômetragem.
_Menina novinha num guenta, não. Fica correndo atrás. Sufocando o macho. Se soubesse disso aos vinte, num teria sobrado um pra contar história. Gargalhada geral.
_Programe o percurso direitinho, igual eles fazem. Esqueça o coração batendo forte e aja com a cuca. Suporte a solidão, você num vai morrer. O pneu pode furar no caminho. Nesse caso, troque logo e siga em frente.
À essa altura, esqueci que tinha uma reportagem pra fazer.
A prosa com a guru do asfalto seguiu por mais vinte minutos.
_ Tira o pé do acelerador. Vai só regulando com a embreagem, sem pressa. Na maciota. Senão, espanta o alvo. A água vaza pra fora da bacia, entendeu?.
Você não tá gravando isso não, né filha?
Não, Dona Vani. Só na memória...
Boa viagem.
Adoro essas filosofias do dia-a-dia! A sabedoria vem de onde menos se espera...
ResponderExcluirSe puder, leia em www.filosofiadebotequim.com uma homenagem que faço a vocês, mulheres, que vivem para nos embevecer!
Parabéns pela percepção!
É, eu acho que isso faz sentido sim... rs
ResponderExcluire eu tava pensando nisso minutos antes de ler isso...
ResponderExcluirÁs vezes a bacia não tem tanta água.Muitos amores fogem, desaparecem.Alguns até voltam.Não voltam por saudade ou por tentar mudar algo que deu errado da primeira vez. Voltam simplesmente por comodidade.Desistiram de se aventurar.Acho que o vinho fez efeito.Ela ainda não voltou.Nem eu quero mais.Parabéns pelo seu trabalho. Eu sigo você no Twitter,você ainda não.Ivan Nascimento
ResponderExcluirAdorei a lição da Dona Vani. Eu já parei para pensar em algo parecido, mas nunca consegui encontrar um exemplo que explicasse tão bem essa questão quanto esse. O que ela disse é certo, mas não é tão fácil na prática, né? Realmente exige experiência. Muita quilômetragem. Malandragem.
ResponderExcluirEstou com 19 anos e ainda tenho muitos quilômetros para acumular. Sua história pode me ajudar a pegar alguns atalhos na estrada hahaha.
Beijo Mariana.
Isso que é professora!!!
ResponderExcluirBjins.
Boa! Dona Vani sabe tudo! Malandragem pura!.rsrsrs
ResponderExcluirE mto boa a sua percepção da frase e ele rendeu ótimo texto!
Beijos, Mariana!
PS: E o sol apareceu no domingo pro João Pedro ir ao Jardim Botânico... rs
Ótima semana!
Com a devida licença, foi impossível não se inspirar com Dona Vani.
ResponderExcluirBacia D'água
Sou a ti, como a água
Que preenche a bacia, até a boca
Se me mexes, eu transbordo
Se me acalmas, sou remanso
Não me puxes tão depressa
Pois eu posso me esvair
Mas empurras, sem que eu peça
A teus pés, irei cair
Peço que me mova devagar
Sem que eu possa nem notar
Estarei junto de ti
Quando menos esperar
Mas não me deixes para lá
Ao léu, parado, quieto
Pois eu posso evaporar
E a bacia esvaziar
Obrigado pela inspiração, Mary...
Mari Adoro Todas as Suas Inpirações! Cada Dia Que Passa Fico Mais e mais apaixonada Pelo Seu Blog, Posso Ate Falar Que Sou Fã Nº 1 ,Obrigada "
ResponderExcluirDona Vani, te amoooooo! :D
ResponderExcluirGross, tava lindaaaaaa no Jornal da Globo!
E a roupa? Loosho!
O cabelo tava ótimo, como sempre! Mas não notei o corte novo!
;*uah
"Aquela senhora com sotaque carregado aprendeu a combater as desiluções nas curvas acentuadas das rodovias.
ResponderExcluir_Fico apaixonada sem ser correspondida? Sumo nas estradas sem deixar rastro. Se ele sentiu algo por mim, que venha atrás das marcas do meu pneu._disse ela."
A fuga da desilusão surge, sempre, por dois motivos: pela culpa ou pela coragem.
Interessante seu blog, Mariana. Passarei a visita mais vezes.
Um grande abraço!
que máximo, Mariana!!!!
ResponderExcluirAmei!!!
Bjs
Sabe o que me faz crer que a criatura nasceu pro jornalismo? A capacidade de enxergar histórias em todo o canto. Que descoberta.
ResponderExcluirUm VIVA sonoro para esta percepção aguçada e afinada. Lindo trabalho, Lady Gross.
Abraços do Sidonio
EXCELENTE!!! Parabéns pelo blog!
ResponderExcluirNatália
Eu não esperava após mais de dez dias de ter lido isto, que seria tão importante pra mim. Acho que certos trechos encaixaram como luvas em certos acontecimentos da minha vida. Ainda bem que só tenho 19 anos e ainda há tempo de usar a bacia pelo resto da vida! Ótima a professora e estou tentando ser uma boa aluna nesse quesito.
ResponderExcluirMinha frase predileta agora é: "Afasta a bacia, Amanda! Afasta a bacia!"
Mostrei o texto pra muita gente. Ah se eu pudesse transmitir todos os comentários positivos que ouvi sobre ele...
Demais, dona Gross! :)
Beijos!
Muito obrigado pelos comentários!!! De verdade. Como é bom saber que alguém lê... Bjos
ResponderExcluirMuito, muito bom! O blog e esse post, principalmente. Queria compartilhar os posts no twitter! Tô tentando sair daqui (porque preciso), mas não consigo rsrs. Bjocas
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